Um dissenso sobre o Projeto de Lei 7.663/10, que pretende reformar da Lei Antidrogas, marcou a audiência pública da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado realizada em 2 de abril na Câmara dos Deputados, em Brasília. De um lado estavam aqueles (as) que prezam pela rápida aprovação do PL; do outro, os (as) que enxergam o dispositivo como um retrocesso no que diz respeito às políticas públicas para drogas.
Os pontos mais criticados giraram em torno das internações, voluntárias e involuntárias, do aumento das penas para usuários (as) e traficantes e da eficácia das comunidades terapêuticas. Apesar das contradições, o PL deverá ser votado no Plenário no próximo dia 9 de abril.
Segundo o psicólogo Dário Teófilo Schezzi, representante do CFP, para compreender problemas como o do crack no Brasil, é necessário enxergar o contexto em que as pessoas vivem. "Temo que o PL 7.663/10 piore a situação das pessoas que vão parar no sistema penal. O projeto tem vários retrocessos e um dos principais é a não garantia dos direitos à dignidade humana, assegurado pela Constituição Federal. O aumento das penas não vai resolver a questão", defendeu.

"Não é penalizando que iremos resolver esta questão", afirmou o representante do CFP Dario Teófilo Schezzi
O aumento das penas para usuários (as) e traficantes foi duramente criticado pela representante do Conselho Nacional dos Secretários de Estado da Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e Administração Penitenciária (Consej), Maria Tereza Uille e pelo representante do Viva Rio, Sebastião Santos. "Prendemos muito mais em razão do tráfico do que em danos ao patrimônio ou homicídios", aponta Uille.
Para eles, a condenação por tráfico deveria levar em conta a natureza e a quantidade de droga, local, condições, circunstâncias sociais, conduta e antecedentes criminais dos indivíduos. "Precisamos de uma lei que defina o que é usuário (a) e o que é traficante. Uma legislação que criminaliza não é um avanço", considera Santos.
A discussão sobre internação involuntária foi criticada pelo representante da Associação Brasileira de Psiquiatria, Rodrigo Godoy Fonseca, que afirmou que, aproximadamente 99% das internações no Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas (Cratod), do Rio de Janeiro, foram voluntárias e apenas 1% de forma involuntária, mas não compulsória. "A internação involuntária deve ser o último recurso", explica.
As comunidades terapêuticas no sistema nacional de tratamento de dependentes também foram alvo de críticas no PL. O professor da Unicamp, Luiz Fernando Tófoli, ressalta que existem entidades sérias, mas não são todas. "O projeto não permite a fiscalização adequada e coloca o poder de administração nas próprias comunidades", argumenta.

Manifestantes protestaram contra as mudanças na Lei
A audiência pública contou a presença do CFP, do Conselho Nacional dos Secretários de Estado da Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e Administração Penitenciária (Consej), da Organização Viva Rio, do Conselho Nacional Antidrogas, da Associação Brasileira de Psiquiatria, de professores e de parlamentares. O CRP SP também esteve presente nos debates, representado pela Conselheira Roberta Lemos. Para ela, uma política para usuários de crack, álcool e outras drogas não admite soluções simples. "O PL 7663/2010 e substitutivo evidenciam não só um retrocesso dos avanços das políticas no Brasil, mas reforçam algumas práticas cuja ineficácia já foram comprovadas. Somos contrárias (os) a sua aprovação e a favor de um debate que respeite os direitos humanos e a pluralidade da sociedade brasileira para, assim, ser possível produzir respostas públicas adequadas à complexidade da questão", afirmou Roberta.
Parecer
O CFP elaborou um parecer que contempla vários contextos da questão das drogas contidos no PL, que foi entregue aos (às) parlamentares que estavam na audiência. O documento enfatiza que a aprovação do dispositivo potencializará os efeitos perversos das abordagens tradicionais na área, aumentando o número de prisões e o tempo de privação da liberdade. O projeto poderá, ainda, aumentar as condenações, criando uma indústria de internações compulsórias, aumentando de forma exponencial a despesa pública e violando os direitos elementares de pessoas em situação de fragilidade social.
Leia a íntegra do parecer.